segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Fun home - uma tragicomédia familiar

Acabo de ler a premiada obra de Alison Bechdel: a auto biográfica Fun Home - Uma tragicomédia em família, rendeu um prêmio Eisner à autora em 2007. Merecido.
A história é a da própria Alison, narrada desde a infância até começo da vida adulta. Nesse sentido, lembra um pouco o Retalhos de Craig Thompson (já comentado neste blog). Mas em Fun Home os assuntos são menos convencionais e, portanto, o risco de abordá-los de forma apelativa seria grande, não fosse a imensa sensibilidade e cultura da autora e sua busca por revisitar sua história familiar com um olhar munido de humanidade e compaixão. Assim, conhecemos seu falecido pai e seu conflito com a própria sexualidade, sua divisão entre o trabalho como professor e no serviço funerário (negócio familiar herdado). Daí o trocadilho do título: Fun Home é um modo de se referir à funerária ou serviço fúnebre nos EUA. E é um jeito sarcástico da autora se referir ao seu lar. O subtítulo tragicomédia já anuncia o que encontramos nas cerca de 200 páginas do livro. É cena comum na família conviver com o pai num cômodo, "preparando" algum cadáver da sociedade local para as última homenagens e, ato contínuo, irem todos jantar. O convívio tão próximo com a morte não tornou menos dolorosa  para a autora a perda do pai, devido a um acidente. O  pensar sobre o fato é recorrente e permeia toda obra, como uma tentativa de compreender se houve ou não algo de intencional por parte da vítima. Teria sido suicídio afinal?
A arte do livro me encantou. O uso de cores é muito banalizado a meu ver. E, de fato, não seria adequado ou correto atribuir à jornada  familiar narrada muitas cores. Poucas infâncias de fato são tão coloridas e na de Alison, fica evidente que seus conflitos internos e domésticos não a tornariam uma artista multicolorida. Seu traçado é do tipo que eu mais gosto. Estilizado, detalhado, expressivo, centrado na figura humana. Tudo sem excesso, bem econômico eventualmente. Muito limpo e bem definido. Lembrou-me outro cartunista, cujo desenho eu amo, o Laerte.
O livro aborda assuntos polêmicos como sexualidade, hipocrisia, traição, arranjos e papéis sociais, casamento, morte e luto de modo lírico e as referências à literatura e filosofia abarrotam alguns trechos (no bom sentido). Não se trata de uma obra light, para distrair (apesar do grande senso de humor e ironia da autora e do texto acessível), como muitos esperam quando pensam num livro todo desenhado (ou seja, história em quadrinho é uma coisa e graphic novel é outra. E mesmo HQs podem sem profundas). É uma obra de certa densidade, que estimula reflexão e demanda um certo despir-se de preconceitos para a leitura.
Para que curte graphic novel como eu, Fun Home é um prato cheio, transbordante e delicioso. Pra quem não conhece, um modo para começar em grande estilo.


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